O Brasil do início dos anos 1960 vivia o seu sonho de modernidade, apesar de grande parte da sua população sofrer com a extrema pobreza. A inauguração de Brasília, obra que gerou muito debate durante o governo Juscelino Kubitschek, era a síntese do sonho materializado numa cidade planejada, elegante, de vanguarda, construída no Planalto Central. Boa parte da sociedade brasileira ansiava por essa modernidade, que resultaria em mais indústrias, mais empregos e mais riqueza, porém, nem todos concordavam com os caminhos que o país deveria tomar para conquistar a tão almejada modernidade.
Para os nacionalistas de esquerda e para os reformistas, era preciso que o Brasil fosse um país moderno e ao mesmo tempo economicamente independente e socialmente justo, equidistante dos blocos capitalista e socialista que protagonizavam a Guerra Fria. Já para os setores conservadores, o mais importante era a modernização econômica, integrada ao capitalismo mundial. Durante o governo de Juscelino Kubitschek essas duas correntes até se equilibraram, porém ao longo da gestão de João Goulart, o dilema político se acirrou, se fez necessário decidir entre um caminho ou o outro.
A fotografia ilustra a posição do presidente Jânio Quadros no início do seu mandato. Contrasta com a fotografia da posse de Jango, quando a conciliação de Jânio não mais funcionou e sua renúncia não surtiu efeito.
Em 1961, o vice-presidente da República, o trabalhista João Goulart, conhecido também por Jango, assumiu a presidência em meio a uma crise política provocada pela renúncia de Jânio Quadros. Para além da crise provocada pela renúncia de seu antecessor, o governo de Jango tinha como desafio lidar com a grave crise financeira que veio do governo de Juscelino Kubitschek e atravessou o governo de Jânio Quadros, com grande endividamento externo do país. A partir de 1962, a taxa de economia, que na década anterior tinha uma média de crescimento de 7%, sofreu uma queda e passou a ter o crescimento de 1,5% ao ano. Como consequência do baixo crescimento econômico, o país enfrentou uma brusca queda de produção e de salários. A massa de trabalhadores se sentia frustrada, o que resultou no aumento das suas reivindicações, sucessão de greves operárias e lutas camponesas.
Neste momento, João Goulart contava com a aprovação popular. Pesquisas feitas pelo Ibope em março de 1964, mantidas em sigilo até a década de 1990, mostravam apoio a Jango: 45% achavam seu governo ótimo ou bom. Também indicavam que ele era o candidato favorito às eleições de 1965, com 49% das intenções de voto. A pesquisa mostrou também que 59% apoiavam suas propostas de Reformas de Base.
Jango enfrentava a resistência dos parlamentares de um Congresso conservador. Ainda assim, conseguiu a aprovação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), a criação da Eletrobrás e da Universidade de Brasília (UnB).
Presidente João Goulart com o primeiro-ministro Tancredo Neves. Na fotografia, evidencia-se o regime parlamentarista, destacando o presidente e o primeiro-ministro.
Em 1961, orientado pelos setores militares a aceitar o parlamentarismo para poder tomar posse na presidência, João Goulart lutou desde o começo pela volta do presidencialismo. Em janeiro de 1963, com 90% de votos a favor, num plebiscito, recuperou os poderes de chefe de governo.
Fortalecido, Jango acelerou os esforços para as Reformas de Base — que eram 16, com destaque para a reforma agrária, reforma da educação, reforma urbana, reforma bancária, reforma tributária, controle das atividades das empresas estrangeiras, reforma eleitoral, salário família e direito de greve. Embora rejeitadas por seus opositores, as reformas propostas por Goulart eram todas capitalistas, mantinham-se dentro das instituições democráticas, tinham o sentido de romper entraves, como o monopólio da propriedade da terra que impediam um amplo desenvolvimento econômico e uma melhor distribuição da riqueza.
Fotografia que elucida sobre a polarização e as ideias populares sobre revolução, reforma e pensamento político. O público do Comício da Central reunia uma frente ampla em prol das Reformas de base. Essa imagem do Arquivo Nacional ilustra essa diversidade e as causas presentes.
As tensões se agravaram com as mobilizações populares pelas Reformas de Base, que tiveram seu auge no comício da Central do Brasil, em 13 de março de 1964, quando Jango defendeu as reformas em curso, com apoio das pessoas que compareceram.
O comício foi organizado por setores políticos que exigiam um maior compromisso do presidente João Goulart com as reformas que ele mesmo propusera. Ao aderir e comparecer ao comício, o presidente sinalizava que deixava de ser moderado e hesitante, como era acusado. Para os setores conservadores, a presença do presidente no comício era sinal de que tinha optado por outro caminho. Oradores se revezaram no palanque e o comício foi encerrado pelo próprio presidente, que prometia as tão esperadas reformas.
Esse ato afetou a oposição e, em resposta, a partir do dia 19 de março do mesmo ano, ocorreram as Marchas da Família com Deus pela Liberdade, em diversos Estados do Brasil, arquitetadas pelos setores conservadores, e convocada por entidades cívicas e religiosas.
A marcha de São Paulo colocou nas ruas da capital paulista cerca de 400 mil pessoas, que protestavam contra o governo, considerado por elas como a porta de entrada para o comunismo no Brasil.
No dia 25 de março de 1964, ocorreu a revolta de marinheiros que reivindicavam representação política. Em 30 de março, Jango fez um discurso pró-reformas, numa assembleia de sargentos. Os marinheiros queriam melhores condições de trabalho e direitos civis, pois nem casar eles podiam sem a autorização.