"E aí, o show foi legal ?"
A resposta veio de uma mais exaltada do banco de trás:
"Cara! Tipo assim, ****!"
E outra emendou:
"Tipo **** mesmo!"
Fiquei tipo assim, calado o resto do percurso, cumprindo minha função de motorista.
Tô precisando conversar um pouco mais com minha filha, senão, daqui a pouco, vamos precisar de tradução simultânea. Pra piorar ainda mais, inventaram o Twitter, essa praga da Internet, onde elas ficam horas e horas escrevendo abobrinhas umas pras outras, em código secreto.
Tipo assim: "kct! vc tmb nunk tah trank, kra. Eh d+, sl. T+ Bjoks. Jubys".
Em português: "Cacete! Você também nunca está tranqüila, cara. É demais, sei lá. Até mais, beijocas. Jubys". Jubys, que deve ser pronunciado "diúbis", é isso mesmo que você está imaginando, a assinatura.
Só que o nome de batismo é Júlia, um nome bonito, cujo significado é "cheia de juventude", que eu e minha mulher escolhemos, sentados na varanda, olhando a lua...
Pois, Jubys, é hoje, essa personagem de cabelo cor de abóbora, cheia de furos na orelha, que quer encher o corpo de piercings e tatuagens.
Tô ficando velho!
Outro dia, tentei explicar pro mesmo bando de adolescentes o que era uma máquina de escrever. Nunca viram uma.
A melhor definição que consegui foi: "é tipo assim... um computador que vai imprimindo enquanto você digita". Acho que não entenderam nada !
Eu sou do tempo do mimeógrafo. Pra quem não sabe, é uma máquina que você coloca álcool e dá manivela, prá imprimir o que está na folha matriz. Por sua vez, essa matriz precisa ser datilografada (ver "datilografia" no dicionário) na tal máquina de escrever, sem a fita (o que faz com que você só descubra os erros depois do trabalho feito), com o papel carbono invertido...
Enfim, procure na Internet, que deve haver algum site sobre mimeógrafo, papel carbono, essas coisas... Se eu ficar explicando cada vocábulo descontinuado, não vou conseguir acompanhar meu próprio raciocínio.
Voltando às garotas, a cultura cinematográfica delas varia entre a "obra" de Brad Pitt e a de Leonardo de Caprio. Há anos tento convencê-las a ver "Cantando na Chuva", mas, sempre fica para depois.
Um dia, cheguei entusiasmado em casa, com a fita de um filme francês que marcou minha infância : "A guerra dos botões".
Juntei toda a família para a exibição solene e a coisa não durou nem 5 minutos! O guri foi jogar bola, Jubys inventou "um trabalho de história sobre a civilização greco-romana que tem que entregar tipo assim até amanhã senão perde ponto"
E, até minha mulher, de quem eu esperava um mínimo de solidariedade, se lembrou que tinha um compromisso com hora marcada e se mandou. Fiquei ali, assistindo sozinho e lembrando do tempo em que eu trocava gibi na porta do Capitólio.
Uma amiga me contou que o filho de 10 anos ficou espantado, quando viu um telefone de discar. Sabe telefone de discar?
É tipo assim, um aparelho sem teclas, geralmente preto, com um disco no meio, todo furado, onde cada furo corresponde a um algarismo. Você enfia o dedo indicador no buraco correspondente ao número que precisa registrar, gira o negócio até uma meia lua de metal e solta a roleta, que, lá por dentro está presa a uma mola e faz ela voltar à sua posição inicial.
Esse aparelho serve para conversar com outra pessoa, como qualquer telefone comum, desde que esteja, é claro, conectado na parede.
Eu sou do tempo em que vidro de carro fechava com maçaneta. E o Fusca tinha estribo e quebra vento. Não espalha, mas, eu andei de Simca Chambord, de DKW, Gordini, Aero Willis e até de Romiseta.
Não dá pra explicar aqui o que era uma Romiseta. Só vou dizer que era tipo assim um veículo automotivo, com 3 rodas, que a gente entrava pela frente e a direção era grudada na porta. Procure na Internet, deve haver um site!
Tá bom, tá bom, confesso mais! Usei Camisa Volta ao Mundo, casaquinho de Ban-lon, assisti à Jovem Guarda, o Direito de Nascer... Mas, o que posso fazer...eu nasci naquela época !
Texto adaptado da crônica do Luis Fernando Veríssimo